Reflexões do Leopardo

Reflexões do Leopardo
Reflexões do Leopardo

domingo, 9 de julho de 2017

Do Panfleto Político à Peça de Teatro

A RDP/Antena 1, a partir das 12 horas de hoje, 9 de Julho.2017, emprestou os seus microfones a dois notáveis comentadeiros da praça, José Milhazes e o ex-embaixador Cutileiro para abordarem o recente encontro pessoal entre Donald Trampas e presidente russo Vladimir Putin.
Milhazes , que tem passado os últimos anos da sua vida como jornalista-correspondente na Rússia (esperemos que fale melhor o russo do que fala o português !), nada sabia sobre o encontro tirante o facto de que este tinha demorado 2 horas em vez dos 30 minutos previstos, portanto norteou os seus comentários por um anti-comunismo paleolítico e pela sua imaginação anorética.
O ex-embaixador Cutileiro taxou de "dirigentes sérios" Ronald Reagan e Gorbachov . Reagan que permanece como um arquétipo das Administrações "cowboys" de extrema-direita sem afivelar a máscara nazi. Gorbachov que ajudou a entregar o Regime Soviético ao Capitalismo , Górbi , em regra sediado em Itália, que hoje faz pela vidinha vendendo conferências a 30.000 €urios a peça. Como Cutileiro também nada sabia de substantivo, foi o entrevistador que verteu a única notícia verdadeiramente relevante : a República Popular da China quadriplicou a sua actividade comercial com a Coreia do Norte.

Após esta introdução - que talvez ajude a enquadrar mais o que se segue do que aquilo que pode parecer - passemos então ao Festival de Teatro de Almada e às duas peças que lá vi ontem.
A primeira, "Operários" da Companhia Útero , com cadastro já conhecido, é fácil e difícil escrever sobre ela.
Fácil porque é simples descrever que são duas espécies de bailarinos em palco que se agitam como se sofressem de epilepsia aguda, que existe um belo corpo feminino que exibem o menos que podem, que todos se desnudam e põem os sexos bem em evidência, que arrastam baldes de água com os quais vão encharcando as tábuas, que atiram cobertores ensopados uns aos outros, que ora um, ora outro dos bailarinos carrega o corpo feminino como se ele estivesse morto, que existe um terceiro homem que transporta garrafões cheios de água e foca por instantes as luzes, que na cena final estão espalhados pelo palco um modelo de veleiro em madeira, um bote de borracha dos fuzileiros, um boneco de plástico a representar um boxeur, duas bandeiras portuguesas igualmente ensopadas, um suposto vaso de flores feito com uns gravetos e rolos de papel higiénico cor-de-rosa. 
Difícil de escrever porque ninguém percebe qual a relação entre o que vai acontecendo em cena e a exploração dos operários em geral, e a exploração dos operários, em particular, nos estaleiros da Lisnave. Difícil de explicar que alguns trechos de boa música não proporcionam obrigatoriamente uma boa coreografia e que uma coreografia, mesmo quando boa, não dá origem necessariamente a um bom espectáculo teatral . É penoso dizer à Companhia Útero, que, por melhores que sejam as suas intenções, a sua produção entra na categoria dos panfletos políticos e que, mesmo como panfleto político, é ilegível.
O público do Festival de Teatro de Almada , usualmente muito generoso no acolhimento prestado às obras representadas no seu Festival , vaiou "Operários" !, coisa que eu nunca tinha visto acontecer em décadas de Festivais almadenses .

O outro espectáculo, "Rumor e alvoradas", representado pelo colectivo belga Raoult Collectif , desmonta a forma de trapacear dos "mírdias" num libelo satírico contra o pensamento único neoliberal, que foram repescar ao chavão cunhado por Margareth Thatcher, "There is no alternative" ( TINA ) ou, em portuga, "Não existe alternativa"
Cinco actores em palco, sem nenhuma actriz, representando homens da Rádio, "mas somos todos a favor do feminismo !", personificando as posturas politicó-sociais que vão dos ex-trotskistas de Maio de 68, passando pelo amante suave das espécies em extinção e da ecologia, ao defensor das empresas privadas de média estatura, ao propagandista do liberalismo político-económico ( porque isso das nacionalizações, do colectivismo  forçado, provou que não resulta, que conduz a um totalitarismo de esquerda" ) trocam opiniões e confrontam-se aos micros da rádio, na sua última emissão, pois foram informados por um telex, em cima da hora, que o seu programa foi encerrado e, em princípio, estarão todos desempregados.
Além das ideologias em confronto, instala-se também entre eles a suspeição, a suspeita de que podem estar a ser traídos por dentro. E tudo isto é tratado num diálogo de associações delirantes e cómicas, que a finalizar simula entrar em diálogo aberto com o público para demonstrar "que não existe alternativa".
O público do palco da D. António da Costa obrigou os 5 actores a voltar à ribalta numa trovoada de palmas.
Em minha opinião de leopardo canhestro pode encontrar-se no "Rumor e alvoradas" um sério candidato a vencedor do Fesival.

Hoje, dia 10 de Julho, o Festival voltou a repor "A perna esquerda de Tchaikovski", representada-dançada pela bailarina clássica Barbora Hruskova, interagindo com o piano de Mário Laginha, que voltou a demonstrar, se preciso fora, que o bailado pode ser excelente teatro. Facto que o público amplamente premiou.
Creio que até cá o Leopardo de outras era glaciares, foi atingido, pois comecei a buscar... a buscar ... não sei o quê, não propriamente gamos ou gazelas para alimento, mas, desculpem o desconchavo, a buscar talvez elevar-me, voar, acompanhar a viagem cíclica e crónica das andorinhas - saberão elas para onde ?... - viagem de prazeres, dores e mortes, viagem para a qual não tenho asas, viagem de catalépsias, de intermitências de esperanças e desesperos, viagem na qual talvez descortine a Estrela Polar, a Via Láctea ou, apenas que as sonhe, o que é quase o mesmo... o que é quase... o que é... o que é o quê ?...         
  


PÚBLICO - Resultado de imagem para fotos ou imagens do espetáculo "A perna esquerda de Tchaikovski



Saudações confiantes

na viagem colectiva do Bando

Leopardo 

Sem comentários:

Enviar um comentário