Reflexões do Leopardo

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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Camões versus óscar

Ontem foi o dia da atribuição dos "oscares" lá nos Hollywoods ( que significa, "bosques sagrados". Uma ironia involuntária...)  - perto da cidade de Los Angeles, onde o gangsterismo assentou arraiais faz décadas.
A cerimónia da atribuição dos "oscares" é uma injecção ideológica anual, de grande projecção a nível planetário, através da qual as forças dirigentes dos "States"procuram veicular os seus valores tóxicos ( a adoração do deus dinheiro, a supremacia de chefiar custe o que custar, o egoísmo, o individualismo, a ausência da solidariedade social, o argumento da força e da guerra para dirimir os conflitos de interesses, o pó-de-arroz da caridadezinha para disfarçar as brutais diferenças entre os que tudo possuem - capital, terra, cultura, bem-estar - e os que de seu só têm os braços e a prole ) a todos os continentes e dominá-los pelos sentimentos e concepções, pois subjugá-los exclusivamente pela força armada sai extremamente dispendioso e a História tem mostrado que não surte efeito a longo prazo.

Esperava-se que a cerimónia deste ano assumisse aspectos inusitados, visto que o Grande Capital norte-americano nunca antes aparecera abertamente com a sua face brutal do nazismo/neonazismo, encarnada na figura apalhaçada de Donald Trump.
Na verdade tudo correu mal para a Administração Trampas , desde a maioria das "estrelas" hollywoodescas a lançarem críticas oblíquas a rejeitarem a xenofobia, o racismo, os muros concretos e culturais entre as nações, os preconceitos ideológicos, a rejeitarem o argumento das armas e da guerra ( poucos foram os que alinharam do lado da Administração Trampesca como Clint Eastwood ou Charleton Heston ). Até ao final caricato de Faye Dunaye e Warren Beaty , convertidos em caricaturas de si próprios quando interpretavam o jovem casal de assaltantes "Bonnie & Clyde", em 1967, verdadeiras múmias de cera a anunciarem o triunfo do filme
"La La Land" em lugar de "Moonlight", engano no qual não tiveram responsabilidade, visto que lhes tinham entregue os cartões errados. Para além de outras trapalhadas menos vistosas e menos badaladas.
Em resumo, tudo achavascou a Aministração da Trampa na primeira sessão de distribuição dos globos de ouro : as críticas ao palhaço, o "gran finale" atarantado de festinha de amadores.

Ora, eu, leopardo luso, descendente de homens que "deram novos mundos ao mundo", venho propor que inauguremos com a devida pompa e circunstância uma gala cinematográfica lusa, anual, de significado ideológico contrário, para promover sociedades novas, solidárias, fraternas, verdadeiramente criativas, gala para a qual não vejo melhor legenda que a figura do gigante Camões.

O material para a estatueta depois se avaliará melhor ( realizaremos concursos públicos ), todavia, para já, podemos ir pensando na cortiça, na madeira de oliveira, de azinheiro, de pinheiro, de castanheiro, ou nos xistos do Douro, nos granitos das serranias. Coisas de homens bravos, habituados a lavrar Atlânticos...

Realizadores é o que não nos falta: os Fernando Lopes, os Espírito Santo, os Fonseca e Costa, os João César Monteiro, até alguns Manuel de Oliveira da cepa mais coeva, os jovens realizadores emergentes que conquistam prémios em Cannes porque não os promovemos no terrunho natal, como Ivo M. Ferreira que dirige a película "Cartas da Guerra" , para a qual escreve o guião entre o onírico e o naturalismo, a partir de um texto de Lobo Antunes

Actores e atrizes? Quantos querem? São às pazadas. Desde os inolvidáveis Vasco Santana, Laura Alves ( a nossa Lélé ) - a pedirem meças ao Charlot -, o Camilo de Oliveira, o Luís Miguel Cintra, o Mário Moutinho, a Teresa Gafeiro, o Paulo Guilherme, a Cucha Carvalheiro (minha colega de curso e de cavalgadas quixotescas montados no rocinante Filosofia),  às fornadas actuais: Herman José, Manuel Marques, Sofia de Portugal, Maria Rueff, Ana Bola, o André Levy, o António Olaio, o João Farraia, o Pedro Lima, etecetera, etecetera, que me desculpem os que agora não me chovem na cachimónia durásia.

Directores de actores? O José Peixoto, o Armando Caldas, o Tavares Marques, o Rodrigo Francisco, o Luís Vicente, o Hélder Costa, a Teresa Gafeiro. 

Cenógrafos? O José Manuel Castanheira e tantos outros que me falham, porém, se me derem um instante, vou à Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA) e trago-lhes um saco cheio de pintores a começar pelos Mestres Jaime Silva e Gonçalo Ruivo; discípulos de Rogério Ribeiro haverá sementeira na Faculdade de Pintura, Desenho e Teatro ao Chiado. 

 Autores de textos e letristas? É um pouco cansativo repisar os nomes do Gil Vicente, do Luís Vaz de Camões, do António José da Silva, do Garrett, mas são incontornáveis... e são Enormes ! Todavia continuam connosco Gervásio Lobato ( o da "Lisboa em Camisa" ), Raul Brandão, Romeu Correia (autor do "Vagabundo das Mãos de Oiro"- que cá o Leopardo tentou encenar -, entre muitos outros textos), Manuel Gusmão ( "Vozes Altas"), Alexandre Delgado ( compositor musical, autor da Ópera "A Rainha Louca" e do seu libreto ), João Monge (letrista contundente de muitos cantores destacados) e, porventura o maior dramaturgo português do século XX, Bernardo Santareno, (médico psiquiatra) que mistura num cadinho poético as fronteiras entre o neorealismo e a psicanálise, cavalgando a luta contra todo o tipo de discriminação : política, racial, económica, sexual, religiosa ( com peças como "O Crime de Aldeia Velha", "O Édipo de Alfama", "O Duelo", "O Punho" - abordagem da Reforma Agrária no Alentejo -,"O Pecado de João Agonia", "O Judeu", "O Inferno", "A Traição do Padre Martinho", "Português, Escritor, 45 Anos de Idade", "P'ra Trás Mija a Burra"  - incursão no teatro de revista em colaboração com Ary dos Santos, César de Oliveira, Rogério Bracinha - ou "Vida Breve em Três Fotografias" - a questão da prostituição masculina ).  

No campo das vozes também não temos mãos a medir. A lendária Luísa Todi que encantou a corte dos czares no século XIX,  Elisabete de Matos catalogada entre as 10 maiores sopranos líricas da actualidade, presença habitual no Met, Giovanni Andreoli, maestro titular do actual Coro do São Carlos ( maestro nascido em Itália, que, depois de mais de duas décadas de profissão  no teatro lírico do Chiado, terá metade da alma portuguesa ), o barítono Luís Rodrigues bem amado do público do São Carlos, e uma série de jovens cantoras e cantores líricos que emergem na cena nacional e internacional.
No campo dos cantautores e cantores de música não-operática é quase insultante recordar Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Dulce Pontes, Mariza, Maria João (um caso ímpar no jazz em Portugal e na estranja), Camané ( a Amália no masculino do Fado ), Ana Moura, ou o superlativo, difícil de enquadrar num só género musical, António Zambujo.

Quanto a poetas, declamadores, neste país de poetas onde a prosa faz figura de intrusa, remontando ao rei D.Diniz e às cantigas d'amigo na língua galaico-duriense, a lista é longa, recordando fugazmente o musical João Villaret, o metamorfósico José Viegas, o vulcânico Ary dos Santos que só a morte interrompeu, até gerações mais recentes onde irrompem Domingos Lobo (escritor, autor de peças teatrais, encenador, actor), Manuel Diogo.

No campo da música destacarei apenas como legendas da sua amplitude Fernando Lopes-Graça, Jorge Peixinho, Emanuel Nunes e o já citado Alexandre Delgado (que foi aluno de Lopes-Graça). 

Poderia continuar a amontoar argumentos em prol da minha proposta de uma Gala Cinematográfica Lusa para contrabater as galas hollywoodescas (mais adequadamente, galinhas), todavia, confesso, até eu já estou maçado com o monte de argumentário que desencantei num ápice, o que fará Vossas Senhorias, meus estimados leitores... Portantos, punhamos um ponto final na matéria. Não me obriguem a voltar a ela!...



Resultado de imagem para fotos ou imagens da cerimónia dos Oscares       Resultado de imagem para fotos ou imagens de um filme João César Monteiro  



Saudações confiantes na luta colectiva, debatida e organizada

do Leopardo         
  

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