Reflexões do Leopardo

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sábado, 21 de julho de 2018

O Mundo em Três Bailados

Antes de iniciar esta reflexão hesitei  entre escrever no título "O Mundo e Três Bailados" ou "O Mundo em Três Bailados" , dado que um dos ardis da bela língua pátria não reside somente na variedade de sons que podem assumir cada uma das suas vogais, mas também nas suas complexidades gramaticais, herdeiras do latim. De facto entre a preposição "e" a conjunção "em" existe um pulo de lobo.
Ora, ao pegar nos 3 bailados, começarei exactamente pelo que vi em último lugar na sala principal do TMJB, enquadrado no excelente Festival de Teatro de Almada, para teclar que considero "Estado de sítio"  "L'État de siège", na denominação original francesa, inspirado na obra do francês-algerino Albert Camus, quiçá o único "existecialista" que decididamente aprecio ) do encenador Emmanuel Demarcy-Mota um " vero capolavoro" ! Devo confessar que nos primeiros momentos do meu visionamento e audição desta Ópera em que o canto, o teatro, o bailado se fundem num drama de significado terrível, violento, letal, o conjunto me parecia excessivo e que se ia perder numa destas purgas psicanalíticas, todas enoveladas dentro de lençóis, abraços, beijocas, tão ao gosto das modas em curso. Posteriormente, conversando com Amigos cuja opinião muito prezo, verifiquei que os nossos pontos de vista convergiam.
Porém, bem depressa a realidade mostrada no palco caía-nos em cima da razão, da intuição, dos sentimentos. O que nos era representado nas tábuas do palco, era o registo justo e severo do nazismo hitleriano e das hordas assassinas da Gestapo e da Wermarcht cuja crueldade jorrava directamente de uma lógica anti-humana cujo alvo final era "uma paz dos cemitérios de mil anos" , fundada numa suposta pureza do sangue ariano e na riqueza sem rosto do Grande Capital .
Projectos que voltam a estar de novo em voga - por mais impossível que pudesse ser imaginado - hodiernamente encabeçados pelas actuais Administrações Cowboys dos USA , "déguisé avec un divertissement" que acorre ao nome de Donald Trampas .
Que fique aqui claro: o "Estado de Sítio" de Demarcy-Mota não encena o terrorismo das ideologias políticas que perderam a confiança na força das suas convicções para atraírem os Povos para o seu lado ( como escreve o "Guardian" ) , Demarcy-Mota encena o Terrorismo das Grandes Potências Imperiais que almejam subjugar o Planeta aos seus desígnios e que, volta não volta, agitam o terrorismo vesgo quando consideram dar-lhe jeito.


Resultado de imagem para fotos ou imagens da obra "Estado de sítio" de Emmanuel Demarcy-Mota Resultado de imagem para fotos ou imagens da obra "Estado de sítio" de Emmanuel Demarcy-MotaResultado de imagem para fotos ou imagens da obra "estado de sítio" de emmanuel demarcy-mota


Curiosamente, o "capolavoro" de Demarcy-Mota ( encenador habitualmente residente em Paris ou em digressão pelo mundo, onde é conhecido e reconhecido ) permitiu-me apreender melhor, retrospectivamente, os outros dois bailados. 
" A tecedura do caos" da coreógrafa Tânia Carvalho de início maçou-me razoavelmente. Sobressaía o contraste óbvio entre as explosões de ruídos e os movimentos meticulosos, milimétricos mesmo, dos bailarinos, numa oposição sistemática entre o individual e o grupo, para o bailarino individual se reintegrar de novo no grupo e a postura individual ser assumida por outro bailarino/a, que repetia quase obsessivamente movimentos, entre-cortados muito semelhantes. De Homero, da "Odisseia", de Ulisses - do qual, miticamente, somos descendentes ( e que estudei, durante anos, com aturo e prazer na Faculdade, não descobri lá nada ).
Contudo, sobre a influência do Demarcy-Mota, admiti prá-frentemente que a referida exploração da relação entre, os ruídos, os silêncios, os movimentos obsessivos podiam abrir-se a sugestões de mundos outros. Como escreveu Mário de Carvalho "quem disser o contrário é porque tem razão" .

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Por fim, o bailado "A meio da noite" , obra da bailarina e coreógrafa Olga Roriz, autora cujos trabalhos em regra aprecio pelas suas capacidades criativas e de ressonâncias, desta feita a minha apreciação desceu vertiginosamente no meu qualidrómetro.
Roriz dedica a obra ao gigante, dificilmente contestável seja qual for a ponta por onde se lhe pegue, Ingmar Bergman, mas gigante austero do cinema, crente religioso de um Deus que interroga e afronta com violência com questões como : "como é possível que Tu meu Deus, infinitamente bom e misericordioso, me deixes livre para ser o teu oposto: infinitamente mau, criminoso, violador, ladrão, assassino, sempre pronto a renegar o teu nome em vão ?".
A austeridade da linguagem cinematográfica de Bergman convence-me a mim - fã ateu dos seus filmes - da sua sinceridade.

Ora, Roriz faz deslizar este afrontamento ser-humano "versus" ser-divino, entre o terreno e o transcendente, para umas variações em dó menor em torno da sexualidade, da homossexualidade, da transsexualidade . Estará na moda, todavia será uma moda, mais cedo que tarde, que será reduzida ao seu papel no real-concreto. 
  

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Saudações fraternas e confiantes do

Leopardo

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