Planeei esta nova crónica do meu blogue para Vos falar de uma Ópera, mas alterei a ordem de prioridades porque entretanto fui ver a peça "Crise no Parque Eduardo VII", peça encenada pelo João Mota ( esse, o da "Comuna" ), apresentada no Teatro Municipal Joaquim Benite/TMJB, em Almada e precedida de uma "conversa com o público", bastante esclarecedora dos processos de criação do Mota, e alterei a ordem das falas para Vos recomendar vivamente que não percam uma réplica da representação da obra, onde quer que a topem ou, se for necessário, exijam-na ao encenador e à Companhia.
E não a percam porque é tão excelente que, falando de realidades terríveis do nosso tempo, consegue fazer-nos rir, de um riso inteligente, da nossa própria miséria. E não a percam porque , entre outros dons, é travejada por duas interpretações de arrasar : uma do meu Amigo Carlos Paulo, há muito actor maior dos nossos palcos, outra de Igor Sampaio, micaelense de pronúncia indisfarçável. Contudo, uma análise mais esmiuçada da peça e da "conversa com o público" , como merecem, ficará para umas segundas núpcias ( embora tema que estas "segundas núpcias" me façam entrar no patamar dos "recasados", estigmatizado pelo senhor cardeal-patriarca Don Manuel Clemente , e me obriguem a uma abstinência sexual para o resto da minha triste existência, abstinência que não poderá sequer ser mitigada por práticas masturbatórias... ) .
Aviada para já esta urgência, aproximemo-nos então da Ópera de Câmara "Elektra" , de Richard Strauss ( grande compositor alemão que não pertence à família dos vienenses Strauss que o antecedem, embora o compositor de Munique introduza a valsa nas suas obras e a faça equivaler a danças catárticas que fundem o erotismo e a morte ).
As notas do óptimo (e barato) programa do Teatro Nacional de São Carlos - embora eu tenha absorvido por todos os poros do meu corpo a Ópera de Câmara no Centro Cultural de Belém - são ricas de esclarecimentos acerca dos processos de criação do espantoso compositor, da fusão que efectuava nas suas metáforas musicais entre a realidade a acontecer e as terríveis consequências que se lhe seguiram, as quais antecipou.
Por exemplo, conta-nos o musicólogo Sérgio Azevedo que R.Strauss várias vezes terá desabafado "a minha mulher é, frequentemente, bastante mal-educada. Mas sabem uma coisa? Eu preciso disso!" . Strauss referia-se à soprano Pauline de Ahna, super-diva da Ópera daqueles tempos, filha de um oficial prussiano, casada com o enorme compositor cerca de 55 anos, de "comportamento demasiado directo e desbocado", ao nível das cavalariças prussianas, que atirou com a partitura à cabeça do maestro, o próprio Strauss, brevemente seu futuro marido.
De facto, Pauline de Ahna, "mulher determinada, habituada a conseguir o que queria", assegurou-lhe uma vida estável e obrigou-o, no sentido literal do termo - fechando o compositor no seu gabinete de trabalho - até este terminar as obras a que se tinha comprometido dentro dos prazos acordados ( Strauss era mais propênsico a jogar um jogo de cartas - "skat" - com os amigoches do que a respeitar os prazos ).
A psicanalista Clara Pracana explica-nos que "elektra" , no grego de Homero e Sófocles, significava "brilhante" , donde derivam os étimos "electrão" e "electricidade". E a estreia da ópera em Londres, em 1910, propagandeava-a como "a ópera que vai electrizar London".
Isto, como sabemos, num saber de experiência feito, não seria possível com o grego actual, que não iluminou coisíssima nenhuma e conduziu em linha recta ao Siryze" e ao revisionismo palrador, gabarola, a armar a galaroz.
Diz-nos Clara Pracana que "os mortos são ciumentos, possessivos e vingativos. A protagonista da ópera, Elektra, (sobre)vive obcecada com a vingança dos assassinos do pai, Agamemnon. É como se a sombra do pai - o objecto dela - tivesse tomado conta do ego de Elektra".
Elektra era uma das filhas de Agamemnon e de Klytämnestra, pertencia à casa dos Atreus, sobre a qual estava suspensa a maldição dos crimes de sangue, por vingança. Assassínios em família, porque, para os gregos de Homero, Sófocles, Ésquilo, a família é o palco da tragédia.
Isto pode ser aplicado às "famílias actuais", "for instance" "a família europeia", onde as traições e os crimes de sangue, os assassínios começam na economia a várias velocidades e na subordinação à política nuclear e belicista do Estado "cowboy" .
Aliás, o psicanalista Carl Jung, na esteira de Freud, propôs a expressão "complexo de Elektra" como o equivalente ao designado "complexo de Édipo" - necessidade de matar metaforicamente o Pai e ocupar o seu lugar à cabeça da família - , expressão que realmente nunca vingou, mas a concepção de um crime de sangue, de alguém que assassinou o progenitor, e esfrega com frequência as mãos uma na outra para "lavar" aquele sangue impuro persistiu e pode ser detectada em obras como o Macbeth.
Voltarei à "Elektra" e à "Crise no Parque Eduardo VII" só pelo prazer vingativo de Vos moer as cabeças com eles - pois as salas podiam estar mais cheias do que estavam, deviam mesmo estar à pinha, com gente sentada nos degraus da sala, e pelo puro prazer de Vos falar do que é Belo e irrepetível.
Saudações irrepetíveis do
Leopardo
E não a percam porque é tão excelente que, falando de realidades terríveis do nosso tempo, consegue fazer-nos rir, de um riso inteligente, da nossa própria miséria. E não a percam porque , entre outros dons, é travejada por duas interpretações de arrasar : uma do meu Amigo Carlos Paulo, há muito actor maior dos nossos palcos, outra de Igor Sampaio, micaelense de pronúncia indisfarçável. Contudo, uma análise mais esmiuçada da peça e da "conversa com o público" , como merecem, ficará para umas segundas núpcias ( embora tema que estas "segundas núpcias" me façam entrar no patamar dos "recasados", estigmatizado pelo senhor cardeal-patriarca Don Manuel Clemente , e me obriguem a uma abstinência sexual para o resto da minha triste existência, abstinência que não poderá sequer ser mitigada por práticas masturbatórias... ) .
Aviada para já esta urgência, aproximemo-nos então da Ópera de Câmara "Elektra" , de Richard Strauss ( grande compositor alemão que não pertence à família dos vienenses Strauss que o antecedem, embora o compositor de Munique introduza a valsa nas suas obras e a faça equivaler a danças catárticas que fundem o erotismo e a morte ).
As notas do óptimo (e barato) programa do Teatro Nacional de São Carlos - embora eu tenha absorvido por todos os poros do meu corpo a Ópera de Câmara no Centro Cultural de Belém - são ricas de esclarecimentos acerca dos processos de criação do espantoso compositor, da fusão que efectuava nas suas metáforas musicais entre a realidade a acontecer e as terríveis consequências que se lhe seguiram, as quais antecipou.
Por exemplo, conta-nos o musicólogo Sérgio Azevedo que R.Strauss várias vezes terá desabafado "a minha mulher é, frequentemente, bastante mal-educada. Mas sabem uma coisa? Eu preciso disso!" . Strauss referia-se à soprano Pauline de Ahna, super-diva da Ópera daqueles tempos, filha de um oficial prussiano, casada com o enorme compositor cerca de 55 anos, de "comportamento demasiado directo e desbocado", ao nível das cavalariças prussianas, que atirou com a partitura à cabeça do maestro, o próprio Strauss, brevemente seu futuro marido.
De facto, Pauline de Ahna, "mulher determinada, habituada a conseguir o que queria", assegurou-lhe uma vida estável e obrigou-o, no sentido literal do termo - fechando o compositor no seu gabinete de trabalho - até este terminar as obras a que se tinha comprometido dentro dos prazos acordados ( Strauss era mais propênsico a jogar um jogo de cartas - "skat" - com os amigoches do que a respeitar os prazos ).
A psicanalista Clara Pracana explica-nos que "elektra" , no grego de Homero e Sófocles, significava "brilhante" , donde derivam os étimos "electrão" e "electricidade". E a estreia da ópera em Londres, em 1910, propagandeava-a como "a ópera que vai electrizar London".
Isto, como sabemos, num saber de experiência feito, não seria possível com o grego actual, que não iluminou coisíssima nenhuma e conduziu em linha recta ao Siryze" e ao revisionismo palrador, gabarola, a armar a galaroz.
Diz-nos Clara Pracana que "os mortos são ciumentos, possessivos e vingativos. A protagonista da ópera, Elektra, (sobre)vive obcecada com a vingança dos assassinos do pai, Agamemnon. É como se a sombra do pai - o objecto dela - tivesse tomado conta do ego de Elektra".
Elektra era uma das filhas de Agamemnon e de Klytämnestra, pertencia à casa dos Atreus, sobre a qual estava suspensa a maldição dos crimes de sangue, por vingança. Assassínios em família, porque, para os gregos de Homero, Sófocles, Ésquilo, a família é o palco da tragédia.
Isto pode ser aplicado às "famílias actuais", "for instance" "a família europeia", onde as traições e os crimes de sangue, os assassínios começam na economia a várias velocidades e na subordinação à política nuclear e belicista do Estado "cowboy" .
Aliás, o psicanalista Carl Jung, na esteira de Freud, propôs a expressão "complexo de Elektra" como o equivalente ao designado "complexo de Édipo" - necessidade de matar metaforicamente o Pai e ocupar o seu lugar à cabeça da família - , expressão que realmente nunca vingou, mas a concepção de um crime de sangue, de alguém que assassinou o progenitor, e esfrega com frequência as mãos uma na outra para "lavar" aquele sangue impuro persistiu e pode ser detectada em obras como o Macbeth.
Voltarei à "Elektra" e à "Crise no Parque Eduardo VII" só pelo prazer vingativo de Vos moer as cabeças com eles - pois as salas podiam estar mais cheias do que estavam, deviam mesmo estar à pinha, com gente sentada nos degraus da sala, e pelo puro prazer de Vos falar do que é Belo e irrepetível.
Saudações irrepetíveis do
Leopardo
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